SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) - Apenas três dias após o sargento Adriano Fernandes de Campos ser absolvido da acusação de ter participado do assassinado do adolescente negro Guilherme Silva Guedes, 15, viaturas da PM-SP (Polícia Militar de São Paulo) foram flagradas em vídeo rondando o imóvel onde o jovem morava com a avó, Vera Rodrigues.
As imagens obtidas pelo reportagem, captadas por câmeras de segurança neste fim de semana, mostram policiais militares em frente à casa em Americanópolis, zona sul de São Paulo.
A família, que repassou nesta segunda-feira (18) o conteúdo à corregedoria da corporação, acusa os agentes de terem tentado abrir o portão do imóvel na noite de sábado (16). Em um registro no dia seguinte, um PM sacou o celular e fotografou o local.
Procurada, a PM-SP ainda não se manifestou sobre o caso. O posicionamento será incluído nesta reportagem assim que for encaminhado à reportagem.
As primeiras imagens dos policiais militares na área foram captadas às 23h11 do último sábado, quando dois policiais militares desembarcaram de uma viatura em frente à casa da família. Enquanto o condutor manobrava para estacionar o veículo junto ao meio-fio do outro lado da rua, é possível ver os agentes em frente ao imóvel.
Em depoimento ao qual a reportagem teve acesso, a família acusa os agentes de terem forçado o portão.
A versão foi reforçada pelo advogado Paulo Malvezzi, do movimento da Rede de Proteção e Resistência ao Genocídio, que presta assistência à família no caso.
Segundo ele, a avó do adolescente morto não prestou depoimento porque disse que não conseguiria reconhecer os policiais envolvidos na ação devido à falta de luz e ao uso de máscaras de proteção contra a Covid-19.
"A Joice ligou para ela [a avó de Guilherme] durante o depoimento para detalhar a tratativa com os policiais, que tentaram abrir o portão", explicou Malvezzi, em entrevista à reportagem.
Em outro vídeo registrado às 9h40 do último domingo (17), dia seguinte ao episódio, uma viatura apareceu novamente. Um policial desembarcou do carona e fotografou a fachada do imóvel com um celular. Imagens feitas pelo celular de uma moradora ainda mostraram os agentes fazendo abordagens no local. Às 17h37, um comboio formado por quatro viaturas foi filmado na rua.
"Essas viaturas que fizeram operação ostensiva nunca foram vistas daquela forma na região. Foi claramente uma ação de intimidação", disse o advogado Paulo Malvezzi.
Por decisão da maioria do júri, o TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) absolveu no dia 13 deste mês o sargento Adriano Fernandes de Campos da acusação de ter assassinado o adolescente negro Guilherme Silva Guedes.
O jovem foi morto em junho de 2020 com um tiro na nuca e outro no rosto após ter sido sequestrado. Ele morava com a avó e estava em frente à casa dela quando foi rendido por dois homens. Segundo a Polícia Civil, Guilherme foi sequestrado próximo de sua casa e levado para um local na divisa de São Paulo com Diadema, onde seu corpo foi abandonado.
Também acusado pelo crime, o ex-PM Gilberto Eric Rodrigues ainda não foi julgado. Rodrigues é suspeito de ter participado de mais de 70 homicídios. Campos e Rodrigues foram acusados pelo MP (Ministério Público) de homicídio qualificado por motivo torpe e emprego de meio cruel, que impossibilitou a defesa da vítima.
Foi decisiva para o caso a investigação feita pela família, que localizou um vídeo em que Campos e Rodrigues aparecem perto de uma viela onde o adolescente morto foi visto pela última vez.
Durante o interrogatório do acusado, em janeiro, a defesa de Campos admitiu que é o sargento que aparece nas imagens, mas que o policial nega participação no crime.
À época, o caso provocou indignação na região. Apesar dos apelos da família para que não houvesse violência, moradores realizaram protestos em que houve depredação de ônibus. A PM reprimiu a manifestação com balas de borracha e gás lacrimogêneo.
Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2020, levantamento feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 79,1% das pessoas mortas por policiais no Brasil são negras.
Na esfera do poder público, não existe uma divulgação transparente de dados oficiais nacionais sobre homicídios ou sobre mortes provocadas por policiais em todo o Brasil. O governo brasileiro também não disponibiliza dados nacionais sobre as investigações e punições de homicídios.
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